Antonio Benetazzo – Permanências do Sensível – Exposição em Cartaz no CCSP (Centro Cultural São Paulo)
É necessário lembrar constantemente das atrocidades ocorridas no passado para não repeti-las no presente.[1]
Antonio Benetazzo was an Italian-Brazilian teacher, artist and activist who fought against the dictatorship and was brutally assassinated in 1972. His death was registered as though if he was run over and, for 42 years his true history remained unknown. His career as an artist was interrupted and his works remained also unknown to the public, spread at the houses of his friends and family. Today the exhibition Antônio Benetazzo – Permanências do Sensível tells his history and exhibits 90 of his works. The exhibition, curated by Reinaldo Cardenuto, is open at Centro Cultural São Paulo until May 29th, 2016.
A obra de Antonio Benetazzo, o filme Entre imagens (que faz parte da mostra) e a organização do espaço expositivo em si tem em comum o tema do intervalo. Tanto traço inacabado, quanto o filme, com seus espaços sem imagem e o espaço expositivo separado em segmentos são permeados por espaços sem imagem.
A exposição é constituída por seis segmentos, dos quais os cinco primeiros traçam a trajetória do artista e separam sua obra em grupos segundo sua pesquisa estética. A sexta parte é a projeção do documentário-ensaio Entre imagens (intervalos) dirigido por Reinaldo Cardenuto e André Fratti Costa. O espaço expositivo é composto por diversos painéis que formam um retângulo e separam dentro deste, os diversos eixos temáticos da obra de Benetazzo. No meio há mesas de vidro exibindo livros e cadernos do artista, revelando suas influências e inspirações.
Os primeiros cinco segmentos separam por grupos temáticos a variedade de estilos da pesquisa estética do artista. Desde suas primeiras obras, com grande experimentação de técnicas, até suas obras mais engajadas, que dialogam diretamente com a militância. Há portanto uma grande variedade de temas indo desde uma pesquisa formal e abstrata, com grande influência de Wassily Kandinsky, até uma obra mais engajada e crítica, contra o regime autoritário, que dialoga com as gravuras de Goya. Ademais em suas experimentações ele usou técnicas variadas, como aquarela, nanquim, colagem e desenho. Essa variedade de temas e de técnicas resulta numa obra muito rica, que reflete a vida do artista, que se dedicou tanto às artes quanto à política.
Sua obra reflete seu interesse ora na forma, ora na política. Algumas imagens, principalmente as do início de sua carreira artísticas apresentam a questão da forma e dos materiais como tema principal. Já em sua produção posterior aparecem imagens como a bandeira de Cuba ou a dos Estados Unidos. Data desta época também um autorretrato no qual o artista se representa como um guerrilheiro. O autorretrato é um tema recorrente em sua produção artística e na exposição é possível observar que ele o fez diversas vezes, experimentando técnicas diferentes. Um deles conta apenas com um traço delicado, sem nenhuma cor, em um outro o artista usa o lápis de cor para um preenchimento parcial da imagem, outro foi feito com nanquim, outro com lápis e apenas a gravata está colorida, com aquarela. Aquele em que Benetazzo se representa como um guerrilheiro é o mais tardio dentre eles, feito após o período que viveu em Cuba.
Os desenhos e colagens do artista usam vazio como linguagem. O traço inacabado faz com que o branco do papel seja integrado como parte da imagem e não apenas como pano de fundo. Em muitos de seus desenhos apenas partes da imagem tem cores, assim como suas colagens que, ao deixar de ocupar todo o espaço do suporte, usam o não-preenchimento como figura estética. O traço inacabado convida o receptor a projetar a sua imaginação sobre a tela, continuando ele mesmo a imagem traçada pelo artista. Sendo assim este espaço não-preenchido passa a ser o espaço da possibilidade, que pode ser preenchido diferentemente pelas pessoas que observam a imagem.
Dialogando diretamente com a obra do artista, o curta Entre imagens (intervalos) trata detalhadamente da obra, do assassinato e da biografia do artista, inclusive com entrevistas de familiares. O curta-metragem também explora a questão do não preenchimento. O filme começa com a única imagem em movimento do artista. Esta imagem, uma cena de um filme no qual Benetazzo foi figurante, revela ao fundo um jovem muito magro de cabelos pretos que fica apenas alguns segundos em cena. Logo em seguida esta imagem se repete, mas desta vez com intervalos, intercalando o vazio com estes poucos segundos da imagem de Benetazzo. Desta forma, assim como as obras do artista, o filme cria um espaço de não-preenchimento. Este movimento, que se repete em diversos momentos do curta-metragem, dialoga também com o próprio funcionamento do cinematógrafo, com o abrir e fechar do diafragma.
A vida de Antonio Benetazzo também foi pautada por intervalos, pois nos momentos em que não era artista era militante e nos momentos em que não era militante, era artista. Duas atividades que se intercalam. Uma só pode existir no intervalo da outra e vice-e-versa. É da natureza da arte refletir de alguma forma o contexto social e a arte de Benetazzo testemunha não apenas o momento em que o artista viveu, mas também seu engajamento político. Além de incitar uma reflexão sobre a relação da arte com a política, a exposição Permanências do Sensível é uma oportunidade para lembrar e refletir sobre o regime militar, que não só impediu a democracia e livre circulação de ideias, mas atingiu a sociedade como um todo.
[1] Texto da exposição Antonio Benetazzo – Permanências do Sensível
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